Novo artigo publicado na revista The Lancet Regional Health - Americas estima que mais de 1 milhão de cirurgias eletivas e emergenciais foram acumuladas no Brasil em 2020 devido à pandemia de Covid-19. O trabalho é uma colaboração entre o Programa de Cirurgia Global e Mudança Social da Harvard Medical School e pesquisadores internacionais.
“Nossa publicação representa a primeira de um país da América Latina sobre o acúmulo de cirurgias provocado pela pandemia”, diz um dos autores do artigo, Dr. Rodrigo Vaz Ferreira, Professor na Universidade do Estado do Amazonas e aluno de pós-graduação da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Além dele, o Prof. Nivaldo Alonso, do Departamento de Cirurgia da FMUSP, é quem coordena o grupo de pesquisa de Cirurgia Global brasileiro que integra a publicação.
Como metodologia, o estudo utilizou dados do serviço público de saúde (DATASUS) sobre cirurgias realizadas no período de 2016 a 2020. Através de modelo estatístico, estimou-se um volume cirúrgico esperado para o período de pandemia, entre março de 2020 e dezembro de 2020. Ao comparar esse valor com os dados reais fornecidos pelos estados, verificou-se um acúmulo de mais de 1.100.000 cirurgias, sendo 928.758 procedimentos envolvendo cirurgias eletivas, aquelas que não são consideradas de urgência.
Segundo Ferreira, esse padrão acompanha o de outros países com grande volume de intervenções cirúrgicas. “Por um lado, essa redução se explica pela priorização de procedimentos mais urgentes, realocação de recursos e manejo dos profissionais de saúde durante a pandemia”, afirma o pesquisador.
Outro aspecto a ser notado é que os estados com políticas governamentais mais rígidas de contenção do vírus, como fechamento de escolas, locais de trabalho e proibições de viagem, conseguiram manter o nível de funcionamento das cirurgias de urgência, graças à preservação de recursos e leitos, apesar do grande atraso nas cirurgias eletivas. “O atraso de 1 milhão de cirurgias é muito significante para o Brasil, que já tem um sistema de saúde bastante sobrecarregado”, afirma o Dr. Fábio Botelho, Cirurgião do Trauma e Pediátrico, pesquisador na Universidade McGill, no Canadá, e um dos coautores desse estudo. “Infelizmente, acreditamos que será possível observar um aumento do número de mortes e sequelas por pacientes que deixaram de obter atendimento cirúrgico.
”A análise desses dados, entretanto, pode informar políticas públicas que atenuem os efeitos desse acúmulo, além de prevenir crises futuras. “Temos que estar preparados, incentivar a população a se vacinar e respeitar as medidas sanitárias locais, pois isso contribui para a preservação dos serviços plenos de cirurgia”, afirma Botelho.